Com uma produção 31% maior na temporada 2018/19, a Associação Nacional dos Exportadores de Algodão (Anea) estima que o Brasil exporte cerca de dois milhões de toneladas neste ciclo, após o abastecimento do mercado interno, contra 1,3 milhão de toneladas da safra anterior.
"De uma tradição de concentrar as exportações no segundo semestre, vamos passar para uma nova realidade de mandar Algodão para fora ao longo dos doze meses do ano. Já nesta safra, a relação de volume por semestre será de 55% a 45%, respectivamente, no segundo semestre de 2019 e no primeiro de 2020, mas em breve esses percentuais vão se equiparar nos dois períodos", disse o presidente da Anea, Henrique Snitcovski, na reunião da Câmara Setorial do Algodão e derivados do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa), realizada na semana passada.
De acordo com pesquisas informais da Anea junto aos armadores, empresas e instituições portuárias, o Brasil já embarcou, de julho de 2018 até a terceira semana de março de 2019, em torno de um milhão de toneladas. Os dados oficiais são aproximadamente 50 mil toneladas inferiores. Até junho, devem partir para o mercado externo 1,3 milhão de toneladas de Algodão em pluma da safra 2017/18. O número é um recorde sobre a marca alcançada em 2011/12, que foi de 1,03 mil toneladas. "Se isso se efetivar, superamos a Índia em volume exportado, e ficaremos atrás apenas dos Estados Unidos", afirmou Snitcovski.
Retomada chinesa
À época do último recorde de exportações, 30% do Algodão brasileiro tinham como destino a China, mas os altos estoques mantidos por política governamental naquele país fizeram com que a demanda diminuísse, chegando a bater em 10%. "Agora, no acumulado do segundo semestre de 2018 ao primeiro de 2019, a China já representa 40% das exportações brasileiras de Algodão - cerca de 400 mil toneladas - e o Brasil segue forte em mercados já consolidados, como Indonésia, Vietnã e Bangladesh, com oportunidades na Turquia e na Coreia do Sul", ressalta o dirigente.
A Anea defende que seja intensificado um trabalho de relacionamento com o gigante asiático, uma vez que o Algodão nacional representou, nos últimos anos, cerca de 10% do montante importado naquele destino. No ciclo atual de exportações da safra 2017/2018, esse número deve crescer para 25%. "Mas não podemos nos confortar com esse incremento, pois sabemos da perda de competitividade do Algodão procedente dos Estados Unidos em virtude das restrições tarifárias aplicadas entre os dois países, temos que aumentar e consolidar a participação do Algodão brasileiro no mercado chinês", diz.
Henrique Snitcovski acredita que, para isso, além de ser competitivo, o Brasil precisa garantir a regularidade do fornecimento, levando em consideração, além do volume de produção, o tempo de trânsito da origem ao destino. "O nosso transit time para a Ásia, principal consumidor, na melhor das hipóteses, leva 35 dias. Em algumas linhas, levam-se 70 dias. Os Estados Unidos entregam em 20 a 22 dias e a Austrália, entre 10 e 12. São os nossos principais concorrentes", diz.
Capacidade
Os tempos de fluxo de comercialização e embarque também vão mudar, segundo a Anea, considerando uma safra maior e a distribuição do escoamento ao longo de doze meses. Snitcovski acredita que o País tem condições de se preparar para isso, uma vez que tem alcançado êxitos recentemente. "No final do ano passado, conseguimos, num único mês, exportar 215 mil toneladas de Algodão. Se fizemos isso em um mês, temos de estar preparados para repetir o feito o ano inteiro.
Indústria
O mês de março criou perspectivas fortes para o setor de transformação de Algodão. Segundo o presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecções (Abit), Fernando Pimentel, o carnaval em março e as chuvas do período aqueceram o consumo no varejo, e, consequentemente, a atividade industrial. O momento, contudo, foi de queda nas exportações de vestuário e têxteis para a Argentina, em torno de 30%, sem previsão de retomada em curto prazo. O país vizinho representa um quarto das vendas brasileiras, e, segundo Pimentel, a expectativa é "desconfortável".
Para 2019, a Abit acredita que terá de rever a estimativa de crescimento, que era da ordem de 2% a 2,5%, e deve cair para algo entre 1,5% e 2%. "Houve um arrefecimento na expectativa da indústria após toda essa cacofonia no cenário político econômico. Logo após as eleições, fizemos uma pesquisa e tínhamos mais de 80% de "ótimo? e "bom? na percepção para o novo governo. Vamos repetir essa pesquisa, mas temos muita clareza de que aquele ímpeto inicial, pelo menos pela ótica da indústria, diminuiu, apesar das conversas sobre a reforma da previdência", disse.
Como ponto positivo, o presidente da Abit diz que, nesse inverno, os varejistas vão poder dar saída aos estoques que sobraram da temporada do frio do ano passado. "O varejo tem mercadoria no pipeline e, havendo frio, essa sobra vai junto e puxa a produção nacional", explica. Em termos de preços no ponto de venda, Pimentel diz que consumidor continua retraído quanto a aceitar pagar por qualquer adicional de valor. O Índice de Preço ao Produtor (IPP) Têxtil e do Vestuário, em doze meses, teve 7,83% de reajuste. "Mas precisaríamos do dobro disso para compensar os aumentos de custo não só com a matéria-prima Algodão, como com energia e outros insumos relevantes". Ele destaca o aumento nos custos com o corante índigo, na área do jeans, por conta do fechamento de fábricas na China.
Preço mínimo
Durante a reunião da Câmara Setorial, o diretor executivo da Abrapa, Marcio Portocarrero, disse que o reajuste no valor do Preço Mínimo, hoje fixado em R$ 64,42 a arroba, é uma prioridade do setor produtivo. O valor é referencial para os programas de crédito do Governo Federal, e também para as ocasiões em que são necessárias subvenções à comercialização e escoamento da safra. O último reajuste, feito na safra 2017/18 para 2018/19, foi de 14,5%. "Mesmo com essa correção, o preço mínimo ainda está defasado em 38%, em relação ao pago pelo mercado, que é de R$ 89,61 a arroba", compara o executivo da Abrapa.
A proposta da Câmara é que se chegue a um valor de R$ 83,19 a arroba. Após a conclusão dos estudos, a Câmara vai entregar a argumentação para a ministra Tereza Cristina, que, se considerar o pleito, apresentará a sugestão à área econômica do Governo. "É importante revisar isso a cada ano. Já ficamos uma década sem mexer no preço mínimo e nunca mais conseguimos alcançar um valor mais aproximado do que é pago pelo mercado", ressalvou Portocarrero.